Economia / Empresas Públicas
Saiba o que está por trás da crise que se arrasta por 12 trimestres de prejuízos
Estatal registra maior rombo da história, com déficit de R$ 4,36 bilhões no primeiro semestre de 2025; gastos salariais, precatórios e perda de mercado explicam crise
19/10/2025
07:00
DA REDAÇÃO
©DIVULGAÇÃO
A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos atravessa uma das piores crises de sua história recente. Após 12 trimestres consecutivos de prejuízo, a estatal fechou o primeiro semestre de 2025 com um déficit recorde de R$ 4,36 bilhões, o maior já registrado desde sua fundação.
Na última quarta-feira (15), a direção anunciou que busca um empréstimo de R$ 20 bilhões para tentar conter a deterioração financeira, garantir liquidez e viabilizar o pagamento de obrigações de curto prazo.
O cenário reflete uma crise estrutural iniciada em 2022, no governo Jair Bolsonaro, e aprofundada durante a gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Após um período de lucros entre 2017 e 2021 — impulsionado pelo boom do comércio eletrônico na pandemia —, os Correios voltaram ao vermelho em 2022 e desde então acumulam prejuízos bilionários.
Em 2024, o déficit foi de R$ 2,6 bilhões, e o resultado do primeiro semestre de 2025 mostra agravamento da crise, com prejuízo mensal superior a R$ 700 milhões.
A estatal também viu seu caixa despencar: em 2023, possuía R$ 3,2 bilhões disponíveis; um ano depois, restavam apenas R$ 249 milhões — uma queda de 92%.
Um dos principais fatores que pressionam as contas é o aumento dos gastos com pessoal. Desde 2022, sucessivos reajustes salariais acima da inflação e benefícios adicionais elevaram de forma expressiva a folha de pagamento.
Em 2022, dois reajustes — de 9,75% e 10,12%, além de abono de R$ 1 mil — impactaram as contas em R$ 820 milhões.
Em 2023, o efeito acumulado foi de R$ 1,3 bilhão.
Em 2024, um novo acordo coletivo trouxe reajuste de 6,57%, aumento de base salarial em 30% e impacto de R$ 894 milhões.
Já em 2025, o acréscimo na folha foi de R$ 547 milhões apenas no primeiro semestre.
Além disso, a empresa firmou um acordo com a Previc para assumir uma dívida de R$ 2,4 bilhões, referente ao Plano de Benefício Definido (PBD) de aposentadoria e pensão, mais R$ 5,4 bilhões previstos para os próximos anos.
Outro fator decisivo foi o impacto do programa “Remessa Conforme”, criado pelo Ministério da Fazenda em 2023, que permitiu que empresas privadas passassem a atuar no transporte de mercadorias internacionais.
Com a cobrança de 20% de imposto sobre compras de até US$ 50 — a chamada taxa das blusinhas —, os Correios perderam parte expressiva do mercado internacional, antes exclusivo da estatal.
Em 2024, a empresa teve redução de R$ 531 milhões em receitas com encomendas internacionais, e, em 2025, a perda já soma R$ 1,3 bilhão em relação ao ano anterior.
O serviço de importados chegou a representar 25% do faturamento da empresa, mas hoje é um dos principais motivos do colapso no caixa.
As despesas com precatórios e ações trabalhistas explodiram após um acordo de desistência firmado com o Tribunal Superior do Trabalho (TST) em 2023, que resultou na aceitação de 3.781 processos sem recurso.
O volume de pagamentos saltou de R$ 485 milhões em 2022 para R$ 1,6 bilhão em junho de 2025 — mais que o triplo.
A previsão é de R$ 913 milhões em precatórios até o fim deste ano e R$ 1 bilhão em 2026.
Segundo relatório financeiro de 2024, apenas 15% das 10.638 agências dos Correios operam com superávit. As demais 85% são deficitárias, mas não podem ser fechadas, pois a estatal é obrigada, pela União Postal Universal (UPU), a manter atendimento em todos os 5.567 municípios brasileiros.
Essa obrigação de universalidade — que impede a empresa de encerrar agências deficitárias — é apontada como um dos maiores desafios da reestruturação.
A deterioração do caixa levou os Correios a contrair empréstimos emergenciais nos últimos anos:
R$ 550 milhões em 2024 com os bancos Daycoval e ABC,
R$ 1,8 bilhão em 2025, com juros de 21,99% ao ano, junto a um consórcio bancário.
O novo empréstimo de R$ 20 bilhões em negociação visa substituir essas dívidas caras, regularizar passivos e dar fôlego até 2026, período em que se espera o início da recuperação operacional.
Mesmo em meio à crise, a empresa manteve investimentos de R$ 830 milhões em 2024, dentro de um plano de transição ecológica.
Foram adquiridos 50 furgões elétricos, 3.996 bicicletas cargo e 2.306 elétricas, além de 1.502 veículos convencionais.
Ao todo, desde 2023, os investimentos somam R$ 1,6 bilhão.
A direção afirma que pretende modernizar a infraestrutura e reduzir custos ambientais, mas reconhece que os ganhos ainda não compensam as perdas financeiras.
O atual presidente, Emmanoel Schmidt Rondon, anunciou um novo pacote de medidas dividido em três frentes:
Corte de despesas operacionais e administrativas — inclui um novo PDV, venda de imóveis ociosos e renegociação de contratos.
Diversificação de receitas — criação de novos produtos, incluindo um marketplace próprio até o fim de 2025.
Recuperação da liquidez — com o empréstimo de R$ 20 bilhões e reestruturação da malha logística e de transporte.
Entre as medidas adotadas desde maio estão:
Redução de 20% do orçamento de funções e cargos comissionados;
Incentivo à redução da jornada de trabalho e suspensão temporária de férias;
Lançamento de novos planos de saúde com economia estimada de 30%;
Captação de R$ 3,8 bilhões com o New Development Bank (NDB) para investimentos internos.
Diante da gravidade da situação, setores do governo e especialistas voltaram a discutir a privatização dos Correios como possível saída.
O jurista Fernando Vernalha defende que o tema seja analisado “sem ideologia, mas com pragmatismo econômico”.
“A gente precisa olhar para o problema dos Correios com uma visão mais pragmática — o que é melhor para o cidadão e para a União?”, avaliou o especialista.
A principal dificuldade, porém, seria desmembrar as operações lucrativas das deficitárias, respeitando as exigências da UPU, que obriga a universalização dos serviços.
12 trimestres de prejuízo consecutivo desde 2022.
Déficit de R$ 4,36 bilhões no primeiro semestre de 2025.
Rombo mensal de R$ 700 milhões.
Aumento da folha salarial e passivos previdenciários.
Perda de mercado com a “taxa das blusinhas”.
Explosão de precatórios e ações trabalhistas.
Caixa quase zerado e alta dependência de empréstimos.
85% das agências operando com prejuízo.
Conclusão:
Os Correios vivem uma crise sistêmica, agravada por decisões de gestão, mudanças regulatórias e passivos acumulados. O empréstimo de R$ 20 bilhões é visto como um fôlego temporário, mas especialistas alertam que sem reformas estruturais ou uma redefinição do modelo de negócio, a estatal continuará vulnerável a novos colapsos financeiros.
Os comentários abaixo são opiniões de leitores e não representam a opinião deste veículo.
Leia Também
Leia Mais
Antes maioria, PSDB mantém comando de apenas duas das cinco maiores cidades de MS
Leia Mais
Em fase de transição, PSDB deve ter nova executiva estadual ainda nesta semana
Leia Mais
Reinaldo Azambuja convoca primeira reunião no comando do PL em Mato Grosso do Sul
Leia Mais
Instrumentos de combate à depressão
Municípios