Sociedade / Comportamento
Censo revela crescimento dos ‘sem religião’ no Brasil: fé em Deus, mas sem vínculo com igrejas
Número de brasileiros sem religião sobe para 9,3%, segundo IBGE, impulsionado por jovens, redes sociais e rejeição às instituições religiosas
16/06/2025
08:00
NAOM
DA REDAÇÃO
©DIVULGAÇÃO
O Censo 2022 revelou que o número de brasileiros que se declaram “sem religião” continua crescendo. Atualmente, eles representam 9,3% da população, contra 7,9% em 2010. Apesar do termo, a maioria desse grupo não se identifica como ateu ou agnóstico, mas sim como pessoas que acreditam em Deus, em uma força superior ou em princípios espirituais, sem necessariamente estar ligada a uma igreja ou instituição religiosa.
O fenômeno reflete uma mudança cultural no país, segundo especialistas da Harvard Medical School, do IBGE e do Instituto de Estudos da Religião (ISER). A busca por espiritualidade tem se tornado mais individualizada, livre e fora dos moldes tradicionais, especialmente entre os mais jovens.
1960: 0,5% da população
1991: 4,8%
2000: 7,4%
2010: 7,9%
2022: 9,3%
A maior concentração está na região Sudeste (10,5%), com destaque para Roraima e Rio de Janeiro, ambos com 16,9%. O perfil predominante é formado por homens (56,2%), majoritariamente jovens de 20 a 24 anos (14,3%). Na população com 80 anos ou mais, os ‘sem religião’ representam apenas 4,1%. Entre os que não têm religião, pardos (45,1%) e brancos (39,2%) são os mais numerosos.
Para a antropóloga Regina Novaes, do ISER, o crescimento desse grupo não reflete um aumento do ateísmo. “Muitos dizem: ‘acredito em Deus, mas não tenho religião’ ou ‘tenho meu próprio altar com meus deuses’”, explica.
Esse comportamento reflete a chamada “religiosidade do eu”, uma forma mais fluida, sincrética e personalizada de se conectar com o sagrado. É comum que pessoas desse grupo misturem práticas — rezam a Ave-Maria, fazem passe no centro espírita, ouvem louvor gospel e consultam um pai de santo, sem se vincular formalmente a nenhuma doutrina.
As novas tecnologias e as redes sociais também têm influência direta nesse fenômeno. As plataformas oferecem acesso fácil a conteúdos religiosos de diferentes tradições e filosofias, permitindo que o indivíduo construa sua própria espiritualidade, sem precisar frequentar templos físicos.
“As religiões se adaptam a um mundo conectado, onde é possível ser religioso, sem ter religião”, observa Novaes.
Desgaste com as instituições religiosas tradicionais;
Crescimento de famílias plurirreligiosas, nas quais os filhos escolhem sua própria crença;
Questionamento de condutas conservadoras, especialmente entre jovens;
Rejeição à intolerância religiosa e à mistura de religião com política;
Impactos da pandemia e da polarização política.
Miliane Araújo, 38 anos, ex-evangélica, conta que abandonou a igreja após se aproximar das religiões de matriz africana. “Hoje não sei no que acredito, mas não é naquele Deus das igrejas que eu frequentava. A polarização, a pandemia e o negacionismo me afastaram ainda mais”, diz.
Ana Paula Lopes, 45 anos, locutora, rompeu com a religião após perder um bebê. “A fé deixou de ser uma palavra usável. Acredito em energia, não em fé.”
Filipe Tourinho, 35 anos, garçom, passou da liderança em igrejas evangélicas à total descrença. “Vejo a igreja como um teatro. Um ambiente que promove manipulação psicológica e atrofia intelectual.”
Para a antropóloga Christina Vital, da UFF, o perfil dos ‘sem religião’ é jovem, urbano e conectado. “Vivemos um contexto de questionamento das autoridades institucionais, inclusive religiosas. Há uma busca crescente por liberdade espiritual, sem vínculos formais.”
A mudança na metodologia do Censo, que deixou de contabilizar crianças de 0 a 9 anos, pode ter freado um pouco mais esse crescimento nas estatísticas.
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