POLÍTICA
Juristas alertam que anistia aos réus do 8 de janeiro fragilizaria a democracia
Especialistas apontam que proposta enfraquece o Estado Democrático de Direito e pode abrir precedente perigoso
16/03/2025
07:15
AGÊNCIA BRASIL
DA REDAÇÃO
©DIVULGAÇÃO
Convocada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, a manifestação marcada para domingo (16), no Rio de Janeiro, defende a anistia aos réus condenados pelos atos de 8 de janeiro de 2023, quando as sedes dos três poderes em Brasília foram invadidas e depredadas. A proposta visa impulsionar a tramitação de projetos no Congresso Nacional que extinguem as punições dos envolvidos.
No entanto, juristas alertam que anistiar crimes contra a democracia pode ser um precedente preocupante. O professor de Direito Constitucional Gustavo Sampaio, da Universidade Federal Fluminense (UFF), afirma que a anistia seria um "mau exemplo" para o país, além de fragilizar a credibilidade das instituições.
“Com democracia não se brinca. Se houve crimes contra a democracia, e todas as provas demonstram cabalmente que esses crimes aconteceram, não é razoável que se conceda o perdão da anistia. Isso seria um incentivo para novas articulações contra o Estado Democrático de Direito”, declarou Sampaio.
A professora Raquel Scalcon, da Fundação Getulio Vargas (FGV), destaca que é difícil justificar uma anistia para crimes que atentam contra o próprio sistema constitucional.
“No fundo, estamos falando de crimes que, pelo menos em tese, pretendiam implodir o sistema democrático. Isso levanta uma preocupação grave”, ressalta.
De acordo com especialistas, a Constituição Federal permite ao Congresso conceder anistia, mas há um debate jurídico sobre se crimes contra a democracia podem ser perdoados. O professor Vitor Schirato, da USP, considera que a aprovação de tal medida representaria um golpe na democracia brasileira.
"É um enfraquecimento enorme da democracia. Seria contraditório que um Parlamento democraticamente eleito concedesse anistia a quem tentou acabar com o Estado Democrático de Direito", explica.
Caso a anistia seja aprovada no Congresso Nacional, especialistas afirmam que a medida será submetida ao Supremo Tribunal Federal (STF), onde pode ser considerada inconstitucional. O histórico do STF mostra uma posição firme contra impunidade em crimes que ameaçam a ordem democrática.
Após a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, manifestantes acampados em frente ao Quartel-General do Exército em Brasília se reuniram na Esplanada dos Ministérios e, sem resistência da Polícia Militar, invadiram as sedes do Executivo, Legislativo e Judiciário.
Os vândalos destruíram mobiliário, obras de arte, objetos históricos e gabinetes, além de equipamentos eletrônicos. As cenas foram transmitidas ao vivo e causaram choque e indignação no país.
✔ Mais de 1,4 mil pessoas foram presas
✔ 1,7 mil foram denunciadas pelo Ministério Público Federal
✔ 370 já foram condenadas por crimes como golpe de Estado e dano qualificado
✔ 63 pessoas receberam penas de até 14 anos de prisão
As investigações da Polícia Federal e da Procuradoria-Geral da República apontam que os atos foram parte de um plano golpista articulado por aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro, que também foi indiciado e denunciado.
No Congresso, diversos projetos tramitam para conceder anistia aos envolvidos no 8 de janeiro. O PL 2.858/2022, do major Vitor Hugo (PL-GO), propõe a extinção das punições para crimes cometidos em manifestações contra o resultado da eleição de 2022.
No Senado, há propostas como:
Os defensores da anistia alegam que há perseguição política contra os condenados. O senador Márcio Bittar afirma que os "brasileiros condenados injustamente precisam de ajuda", enquanto Hamilton Mourão argumenta que a anistia "barraria injustiças e punições desproporcionais".
Se aprovada, a anistia beneficiaria não apenas os participantes dos ataques, mas também os denunciados por articulação golpista, incluindo Jair Bolsonaro.
O professor Gustavo Sampaio destaca que uma anistia para Bolsonaro seria juridicamente questionável, já que ele ainda não foi condenado.
"Se nem há ação penal, não há condenação. Se não há condenação, não há crime. Como o Congresso pode anistiar algo que ainda está em julgamento?", questiona.
Caso o Congresso aprove a anistia, o STF deverá decidir se ela é constitucional e se pode ser aplicada a cada caso específico.
O STF já anulou indultos considerados inconstitucionais, como o caso do ex-deputado Daniel Silveira, condenado a oito anos de prisão. Em decisão anterior, os ministros afirmaram que atos contra a democracia não podem ser perdoados.
"Nenhuma capacidade jurídica é ilimitada. O Congresso não pode conceder anistia em qualquer caso, do jeito que queira", reforça Schirato.
A possibilidade de uma queda de braço entre o Congresso e o STF é alta, caso a anistia seja aprovada. O Supremo tende a interpretar que certos crimes não podem ser perdoados, especialmente quando envolvem o Estado Democrático de Direito.
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